Beleza sem regras
publicado em 03/04/2020
Erica Franquilino - Jornalista
Do espartilho às musas plus size
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Percepções e aspirações dos brasileiros
A modelo canadense Chantelle Brown-Young, mais conhecida como Winnie Harlow, foi chamada de “zebra” e outros apelidos cruéis durante a infância. Ela tem vitiligo, doença que causa a perda gradativa da pigmentação da pele, gerando manchas pelo corpo. Descoberta há aproximadamente cinco anos, ela já posou para editoriais de grifes como Diesel e Dior. “Sou linda porque sei disso. Celebre sua beleza única hoje”, afirmou Winnie, em uma de suas postagens numa rede social.
Apesar da busca massiva por adequação a padrões de beleza, vivemos um momento de contestação desses padrões e de desconstrução de estereótipos. Cresce um movimento de valorização das características que nos tornam únicos, e o diálogo com o espelho torna-se cada vez mais interessante. Campanhas publicitárias de marcas de cosméticos entraram nessa conversa e passaram a destacar a diversidade – de estilos, corpos, etnias, gêneros...
As reflexões sobre padrões de beleza na atualidade fazem parte de uma pauta ampla, que abrange aspectos culturais e sociais, como o empoderamento feminino e a atenção à autoestima, a valorização da naturalidade (a exemplo da ascensão dos cabelos crespos, cacheados e volumosos), os debates sobre as questões de gênero, a visibilidade do público LGBT, o fortalecimento da moda plus size, as discussões sobre quebra de paradigmas nas passarelas e a presença maior de negros em campanhas de produtos de beleza, dentre outros.
“Beleza é definida e redefinida diariamente pelos consumidores e suas idades, gêneros, sexualidades, tipos de peles/cabelos/corpos etc. Isto quer dizer que a percepção do que é a beleza precisa ser recolocada. As marcas devem focar no comportamento das pessoas, ao invés de simplificarem seres humanos complexos em demografias ou usar rótulos baseados em apenas um de seus aspectos [...]. O consumidor de produtos de beleza é mais do que uma parte demográfica, uma geração, ou um gênero – ele é um indivíduo”, diz um trecho do estudo “Tendências Globais em Beleza & Cuidados Pessoais 2018”, produzido pela Mintel.
O trabalho elegeu quatro grandes tendências para este ano. “Minha Beleza, Minhas Regras” é uma dessas tendências. Ela aponta, dentre outros dados, que 33% dos millennials brasileiros, de 19 a 35 anos, gostariam de ver mais propagandas com pessoas que tenham tipos de corpos variados; 40% das usuárias norte-americanas de maquiagem de 25 a 34 anos são frustradas por não encontrarem produtos que combinem com seu tom de pele; e, para 62% dos consumidores canadenses de 18 a 34 anos, não há problemas em quem faz experiências de gênero.
O estudo também revela que 31% dos consumidores chineses de 20 a 49 anos acreditam que a palavra “individualidade” define luxo. A pesquisa ouviu internautas franceses, canadenses, norte-americanos, chineses e brasileiros. No país, foram entrevistadas, em 2017, 1.500 pessoas acima de 16 anos.
Do espartilho às musas plus size
Especialistas afirmam que o conceito de beleza está diretamente relacionado às características culturais e ao momento histórico de um determinado grupo. A percepção a respeito do belo passou por muitas transformações ao longo da história. É um processo dinâmico, em constante mudança e que assume traços distintos em várias partes do mundo.
Nas pinturas renascentistas, as mulheres exibiam formas generosas, que, posteriormente, na era vitoriana (de 1837 a 1901), passaram a ser moldadas em espartilhos. No início do século 20, a mulher começou a se libertar da ditadura dos corpos drasticamente apertados.
A silhueta curvilínea, no estilo violão, foi o padrão nos anos 1950. Após a Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945), a maquiagem ganhou maior relevância no dia a dia das mulheres, sob a influência de divas como a atriz Marilyn Monroe, que fazia o estilo pele pálida, lábios realçados e olhos com muito delineador.
Na década de 1960, o visual da modelo britânica Twiggy estabeleceu uma nova aspiração: a magreza. Ela foi a primeira modelo a ganhar status de celebridade. A indústria da moda aderiu rapidamente à estética dos corpos magros e sem muitas curvas. O padrão imperou nas décadas seguintes, com a ascensão das supermodelos – como Linda Evangelista, Claudia Schiffer, Naomi Campbell e Cindy Crawford –, e ainda impera. Referências de beleza, as modelos continuam sendo majoritariamente altas, brancas e magras – como Gisele Bündchen.
No entanto, as mudanças comportamentais deste início de século, em grande parte alavancadas pelo universo digital, estão conferindo novos contornos à chamada ditadura da beleza. Redes sociais ajudaram a reforçar a exaltação de padrões estéticos e a busca pela imagem perfeita. No entanto, elas também amplificaram as vozes que buscam representatividade e propõem questionamentos.
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