Manual para Comprovação da Segurança Cutânea e Ocular de Pomadas Capilares
publicado em 19/07/2025
ANVISA
Agência Nacional de Vigilância Sanitária
TERCEIRA DIRETORIA – DIRE3
GERÊNCIA-GERAL DE COSMÉTICOS E SANEANTES – GGCOS
COORDENAÇÃO DE REGISTRO DE COSMÉTICOS E SANEANTES – CRCOS
VERSÃO 1 – JUNHO DE 2025
Sumário
4. REQUISITOS TÉCNICOS PARA COMPROVAÇÃO DA SEGURANÇA CUTÂNEA E OCULAR DE POMADAS CAPILARES
4.1. Estudo in vitro de potencial de irritação/corrosão ocular no produto acabado
4.2. Estudos Clínicos de Compatibilidade Cutânea
4.4 Relatório de Avaliação de Segurança
APRESENTAÇÃO
Este manual tem como objetivo orientar o setor regulado de cosméticos sobre os estudos e documentos necessários para comprovação da segurança cutânea e ocular, para fins de registro de pomadas destinadas a fixar e/ou modelar os cabelos, em atendimento ao art. 4º, IV, da Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 814, de 1º de setembro de 2023 (ANVISA, 2023), que estabelece as condições temporárias para a regularização, comercialização e uso de produtos destinados a fixar e/ou modelar os cabelos.
A iniciativa visa assegurar que esses produtos sejam regularizados com base em evidências de segurança, especialmente diante dos relatos de intoxicações oculares graves associados ao seu uso.
2. INTRODUÇÃO
Produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes devem ser regularizados antes de sua fabricação, nos termos do art. 12 da Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976 (BRASIL, 1976). Tais produtos são definidos como preparações constituídas por substâncias naturais ou sintéticas, de uso externo nas diversas partes do corpo humano, com o objetivo principal de limpá-los, perfumá-los, alterar sua aparência, corrigir odores corporais ou protegê-los e mantê-los em bom estado, conforme a RDC nº 907, de 19 de setembro de 2024 (ANVISA, 2024a), que dispõe sobre os requisitos técnicos para a regularização de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes.
A RDC nº 907, de 2024 (ANVISA, 2024a), também estabelece que os cosméticos podem ser sujeitos ao registro ou isentos de registro, sendo, neste último caso, regularizados por meio de notificação junto à Anvisa.
Anteriormente, as pomadas capilares eram regularizadas por notificação. Contudo, diante do contexto de notificações de intoxicações oculares relacionadas a esses produtos, a Anvisa publicou a RDC nº 814, de 2023 (ANVISA, 2023), que estabelece condições temporárias para a regularização desses produtos.
A partir da vigência da referida norma, as pomadas capilares passaram a ser regularizadas por meio de registro, que demanda uma análise prévia da Gerência-Geral de Cosméticos e Saneantes antes da sua aprovação e liberação para comercialização.
Dentre os requisitos estabelecidos para o registro desses produtos, o art. 4º, inciso IV, da RDC nº 814/2023 (ANVISA, 2023), definiu que as petições de registro devem estar instruídas com documentação relativa à avaliação de segurança cutânea e ocular, considerando a formulação, as condições reais de uso, entre outros aspectos.
A referida RDC estabelece ainda que tal avaliação de segurança pode ser realizada seguindo o Guia para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos (ANVISA, 2012), conforme especificado abaixo:
Art.4º
[...]
IV - avaliação de segurança cutânea e ocular, considerando a formulação, as condições reais de uso, entre outros aspectos.
[...]
§ 3º A avaliação de segurança de que trata o inciso IV deste artigo poderá ser apresentada seguindo o Guia para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos disponível no Portal da Anvisa (ANVISA, 2012).
3. FINALIDADE
Diante da necessidade de esclarecimentos e orientações adicionais para um perfeito atendimento das disposições normativas por parte das empresas que fabricam pomadas capilares, este manual detalha, com base nas normas vigentes aplicáveis à regularização de produtos cosméticos, no Guia para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos (ANVISA, 2012) e nas evidências científicas disponíveis, os estudos e documentos necessários para comprovação da segurança cutânea e ocular desses produtos, conforme exigência do art. 4º, inciso IV, da RDC nº 814, de 2023 (ANVISA, 2023), promovendo a transparência regulatória e a proteção à saúde da população.
4. REQUISITOS TÉCNICOS PARA COMPROVAÇÃO DA SEGURANÇA CUTÂNEA E OCULAR DE POMADAS CAPILARES
4.1. Estudo in vitro de potencial de irritação/corrosão ocular no produto acabado
O histórico de intoxicações oculares associadas ao uso de pomadas capilares demonstrou que o contato da pomada capilar com os olhos é considerado previsível, por se tratar de produto de longo tempo de contato com a pele e cabelos, podendo entrar em contato com os olhos de forma inevitável a partir do suor, exposição à chuva etc.
Assim, considerando esse histórico e que, conforme o Guia para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos da Anvisa (ANVISA, 2012), estudos pré-clínicos devem anteceder a realização de estudos clínicos, é necessário que o produto acabado seja submetido à avaliação in vitro de potencial de irritação/corrosão ocular.
Essa avaliação pode empregar um ou mais estudos, utilizando diferentes métodos validados e internacionalmente aceitos, a partir de uma estratégia integrada que deve seguir as recomendações do Guia OECD sobre Estratégias Integradas sobre Teste e Avaliação de Danos Oculares/Irritação – IATA (OECD, 2024).
Cada método possui aplicações determinadas e limitações a depender, por exemplo, do tipo de formulação a ser testada. Pode ser necessária ainda a utilização de mais de um método para avaliação do desfecho, conforme os exemplos abaixo:
- método OECD nº 491 - para que esse método seja adotado, a formulação do produto acabado deve ser solúvel ou formar suspensão homogênea por pelo menos 5 minutos nos solventes discriminados no método (OECD, 2024). É um dos critérios fundamentais para a adoção desse método; caso contrário, deve ser descartado.
- método OECD nº 492B - antes que esse método seja adotado, é preciso avaliar se o produto a ser testado possui baixa solubilidade em água, o que pode resultar em resultado falso negativo (OECD, 2024).
Seja qual for a estratégia integrada adotada pela empresa, é fundamental que se comprove que o produto acabado não apresenta potencial de irritação ocular nem dano ocular grave. Assim, o resultado do ensaio ou do conjunto de ensaios deve garantir que o produto acabado é classificado como “não categorizado” (UN GHS No Cat.) em relação à irritação ocular/dano ocular grave. Não é aceito para fins de regularização como cosmético o produto acabado classificado nas categorias de perigo 1 (UN GHS Cat. 1), ou 2 (UN GHS Cat. 2A ou UN GHS Cat. 2B). As classificações de categorias de perigo estão descritas no Sistema GHS (UN, 2023).
4.2. Estudos Clínicos de Compatibilidade Cutânea
É necessária a apresentação de estudos clínicos que comprovem:
- Irritabilidade primária;
- Irritabilidade acumulada;
- Sensibilização cutânea;
- Fotoalergia; E
- Fotoirritação.
Esses estudos são necessários para confirmar a segurança identificada nos dados pré-clínicos, conforme o Guia para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos da Anvisa (ANVISA, 2012). O Guia aponta ainda que um dos parâmetros a serem considerados para a avaliação de segurança de produtos cosméticos são dados de cosmetovigilância disponíveis sobre o próprio produto e/ou sobre produtos semelhantes. De acordo com dados levantados pela Gerência-Geral de Monitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária da Anvisa, a reação alérgica cutânea é também um dos sintomas relatados. A partir desses dados, é necessário que haja a avaliação da irritabilidade e sensibilização do produto.
Verificou-se ainda que os usuários de pomadas modeladoras se expõem ao sol, visto que esses produtos são de longo tempo de contato com pele e cabelos. Nesse sentido, é necessária a avaliação clínica de fotoirritação e fotoalergia como complementação aos demais estudos de compatibilidade cutânea.
4.3. Documentação Relacionada a Matérias-Primas, incluindo ceteareth-20 (ou outros álcoois etoxilados)
É necessário que a documentação técnica demonstre a qualidade e a segurança das matérias-primas empregadas na formulação, especialmente em relação à presença de impurezas de preocupação toxicológica. Ressalta-se que a lista de substâncias descrita abaixo não é exaustiva, mas apenas exemplificativa. Assim, recomenda-se que a empresa titular do produto cosmético acabado consulte o fornecedor e a literatura científica para dados de impurezas em matérias-primas.
Ceteareth-20 (e outros álcoois etoxilados):
- Identificar o(s) fornecedor(es), fabricante, país de origem, CNPJ e endereço. Se a matéria-prima for importada, identificar também o importador/distribuidor no Brasil, além dos dados do fabricante.
- Apresentar a especificação e quantificação para as impurezas 1,4- dioxane e ethylene oxide, substâncias que podem estar presentes na matéria-prima a depender do processo de fabricação e outros fatores (FIUME et al., 2012)".
As substâncias 1,4-dioxane e ethylene oxide são cancerígenas e de uso proibido em cosméticos, conforme Resolução de Diretoria Colegiada - RDC nº 529, de 4 de agosto de 2021 (ANVISA, 2021), que dispõe sobre a lista de substâncias que não podem ser utilizadas em produtos cosméticos.
Assim, o fabricante deve empregar medidas para que sejam excluídas da matéria-prima final e, consequentemente, não estejam presentes no produto cosmético. Ao mesmo tempo, o art. 6º da RDC nº 529, de 2021 (ANVISA, 2021) permite a presença de substâncias proibidas como traços quando forem tecnologicamente inevitáveis no processo de fabricação e desde que o nível presente seja seguro.
Por isso, é necessário que seja apresentada documentação de todos os fornecedores do ceteareth-20 (ou outros álcoois etoxilados), demonstrando a especificação para as impurezas 1,4-dioxane e de ethylene oxide, informando se estão totalmente ausentes na matériaprima e como é realizado o controle dessas impurezas. Caso a matéria-prima contenha traços dessas substâncias, a documentação deve contemplar os resultados de análise para 1,4-dioxane e ethylene oxide, mencionando os limites de quantificação. Caso a matéria-prima contenha traços de 1,4-dioxane, a concentração máxima dessa substância no produto cosmético acabado deverá ser de, no máximo, 10 ppm, nível considerado seguro (SCCS, 2015). Caso contenha traços de ethylene oxide, a empresa titular do produto deverá sustentar, por meio de literatura científica, que o nível dessa substância é seguro para o uso pretendido.
PEGs (Polyethylene Glycols) - exemplos: PEG-6, PEG-8, PEG-32, PEG-7 glyceryl cocoate:
Essas substâncias também podem conter as impurezas 1,4-dioxane e ethylene oxide (CIR, 2010).
Portanto, é necessário que seja apresentada documentação dos fornecedores da substância demonstrando especificação e resultado para 1,4-dioxane e ethylene oxide, informando ainda o limite de quantificação.
Caso a matéria-prima contenha traços de 1,4-dioxane, a concentração máxima dessa substância no produto cosmético acabado deverá ser de, no máximo, 10 ppm, nível considerado seguro (SCCS, 2015). Caso contenha traços de ethylene oxide, a empresa titular do produto deverá sustentar, por meio de literatura científica, que o nível presente no ingrediente é seguro para o uso pretendido.
Petrolatum:
É necessário que seja apresentada documentação do fornecedor garantindo que todos os antecedentes de refinação dessa matériaprima são conhecidos pelo fabricante e que ela não foi produzida a partir de substância cancerígena, em atendimento à RDC nº 529, de 2021, item 904 (BRASIL, 2021).
4.4 Relatório de Avaliação de Segurança
O Relatório de Avaliação de Segurança deve relacionar todos os dados e estudos que subsidiam a segurança do produto, acompanhado da análise do peso das evidências relacionadas (abordando a relevância, confiabilidade e adequação ao objetivo), tendo como referência a IATA OECD (OECD, 2024). O Relatório deve garantir a segurança do produto e deve estar assinado pelos responsáveis legal e técnico da empresa.
5. REFERÊNCIAS
LEGISLAÇÃO
1. BRASIL. Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispõe sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes e outros produtos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 set. 1976.
2. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 907, de 19 de setembro de 2024. Define, classifica e estabelece os requisitos técnicos para regularização de produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 set. 2024.
3. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 814, de 1º de setembro de 2023. Estabelece condições temporárias para regularização, comercialização e uso de produtos destinados a fixar e/ou modelar os cabelos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 4 set. 2023.
4. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 752, de 19 de setembro de 2022. Dispõe sobre diretrizes gerais para registro e alterações pós-registro de cosméticos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 set. 2022.
5. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 529, de 2 de agosto de 2021. Define as substâncias de uso proibido em cosméticos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 3 ago. 2021.
DOCUMENTOS TÉCNICOS
6. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Guia para Avaliação de Segurança de Produtos Cosméticos. 2. ed. Brasília: Anvisa, 2012. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/ptbr/centraisdeconteudo/publicacoes/cosmeticos/manuais-e-guias/guiapara-avaliacao-de-seguranca-de-produtos-cosmeticos.pdf/view. Acesso em: 10 maio 2025.
7. ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Guidance Document on Integrated Approaches to Testing and Assessment (IATA) for Serious Eye Damage and Eye Irritation. 3rd ed. Paris: OECD Publishing, 2024. (OECD Series on Testing and Assessment). Disponível em: https://doi.org/10.1787/cdb440be-en. Acesso em: 10 maio 2025.
8. UNITED NATIONS. Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals (GHS). 10th rev. ed. New York; Geneva: UN, 2023. Disponível em: https://unece.org/sites/default/files/2023- 07/GHS%20Rev10e.pdf. Acesso em: 10 maio 2025.
ARTIGOS CIENTÍFICOS
9. FIUME, M. M. et al. Safety Assessment of Alkyl PEG Ethers as Used in Cosmetics. International Journal of Toxicology, v. 31, n. 5_suppl, p. 169S244S, 2012. DOI: 10.1177/1091581812444141. Disponível em: https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1091581812444141. Acesso em: 10 maio 2025.
RELATÓRIOS DE COMITÊS CIENTÍFICOS
10. SCIENTIFIC COMMITTEE ON CONSUMER SAFETY. Scientific Opinion on the Report of the ICCR Working Group: Considerations on Acceptable Trace Level of 1,4-Dioxane in Cosmetic Products. Luxembourg: European Commission, 2015. Disponível em: https://ec.europa.eu/health/scientific_committees/consumer_safety/do cs/sccs_o_194.pdf. Acesso em: 10 maio 2025.
11. COSMETIC INGREDIENT REVIEW EXPERT PANEL. Amended Safety Assessment of Triethylene Glycol and Polyethylene Glycols (PEGs)-4, -6, -7, -8, -9, -10, -12, -14, -16, -18, -20, -32, -33, -40, -45, -55, -60, -75, -80, -90, - 100, -135, -150, -180, -200, -220, -240, -350, -400, -450, -500, -800, -2M, - 5M, -7M, -9M, -14M, -20M, -23M, -25M, -45M, -65M, -90M, -115M, -160M and -180M and any PEGs ≥ 4 as used in Cosmetics. Washington, DC: CIR, 2010. Disponível em: https://cir-reports.cir-safety.org/viewattachment/?id=359cc595-8c74-ec11-8943-0022482f06a6. Acesso em: 10 maio 2025.


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