Fotoproteção
Métodos
Resultados e Discussão
Conclusão

 

 

Emulsão é um sistema heterogêneo constituído por, pelo menos, um líquido imiscível disperso em outro líquido na forma de gotículas. Tais sistemas apresentam estabilidade mínima, que pode ser aumentada acrescentando-se substâncias como agentes tensoativos, sólidos finamente divididos, entre outros.

Como os dois componentes básicos de uma emulsão são água e óleo ou uma substância lipossolúvel, é possível classificar as emulsões em dois tipos diferentes – A/O e O/A – segundo a natureza da fase dispersa.1

Testes sensoriais nos permitem medir o quanto voluntários gostam ou não gostam de um certo produto. Esses testes também nos permitem identificar a presença ou ausência de diferenças sensoriais perceptíveis em características como aroma, textura, cor e impressão global, espalhabilidade e sensação de hidratação.2

Neste artigo descrevemos como determinamos a qualidade de um creme fotoprotetor A/O, avaliando controle microbiológico, estabilidade físico-química e apelo sensorial, em comparação com um creme fotoprotetor O/A.

 

Fotoproteção

A distribuição de melanina na epiderme é um dos fatores mais importantes na proteção da pele contra lesões crônicas induzidas pela luz solar, como envelhecimento e câncer de pele. Apesar disso, a melanina é um filtro solar clássico muito fraco, uma vez que apresenta pouco ou nenhum fator de proteção solar (FPS) em concentrações que possam ser consideradas biologicamente úteis.

Melanina é um radical livre bioquimicamente não reativo. É único em sua capacidade de neutralizar os radicais livres produzidos na pele, quando esta é exposta à luz solar.3 Por ser térmica e foto quimicamente estável, a melanina não é degradada por enzimas. Quando aplicada topicamente, neutraliza e remove os radicais livres da pele, além de funcionar como antioxidante. Suas propriedades antioxidantes são comparáveis às do tocoferol, por ser um polifenol hidrossolúvel e, consequentemente, estável sob luz e calor. Porém, a melanina não pode ser usada como substituta dos antioxidantes tradicionais, mas somente junto com estes.3

A eficácia do filtro solar é determinada in vivo pelo FPS, que é um valor numérico. Relaciona o tempo necessário para uma certa dose de exposição à UV provocar o surgimento de eritema perceptível na pele protegida e o tempo exigido para que a mesma dose provoque uma resposta na pele não-protegida. Observa-se uma elevação do FPS na seguinte ordem, desde que quantidades de filtro UV sejam mantidas constates nos diferentes tipos de preparação: loção hidroalcoólica (uma fase), pomadas (uma fase), emulsões tipo O/A (duas fases), emulsão tipo A/O (duas fases).4

O objetivo deste estudo foi a determinação da qualidade de um creme fotoprotetor A/O determinando a contaminação microbiana, estabilidade físico-química e análise sensorial, avaliando aroma, textura, cor, espalhabilidade e impressão global, além de determinar o quanto os consumidores gostaram do produto e se eles observaram, ou não, diferenças significativas entre o creme A/O proposto (Fórmula 1) e um creme O/A (Fórmula 2).

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Métodos

Controle microbiano: O número total de microrganismos e a presença de patógenos – como Salmonella sp, Escherichia coli, Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa – foram analisados segundo métodos descritos na USP5 e na Farmacopeia Britânica.6

Análise de aceitação: Para o teste de aceitação foi usado um grupo de 30 voluntários. A equipe analisou as duas amostras de cremes (Fórmulas 1 e 2) apresentadas em seis combinações de duas ocorrências de uma amostra, e uma ocorrência da outra amostra, codificadas com algarismos de três dígitos. Os voluntários usaram uma escala hedônica de nove pontos7 para relatar seu grau de aceitação das duas amostras, com base em cinco atributos sensoriais.

Análise estatística dos dados: Foi usado um programa de computador (SAS User’Guide: Statistic, SAS Institute (1993), Cary North Carolina, Estados Unidos) para análise estatística dos dados, por análise de variância univariada (ANOVA), testes de médias de Tukey e análise por histograma das classificações hedônicas dos voluntários para os cinco atributos sensoriais de cada uma das duas amostras.

Testes de diferença: As duas amostras de cremes (Fórmulas 1 e 2) foram submetidas a testes triangulares de diferença9 realizados pelos 30 voluntários. O teste χ2 (qui-quadrado)10 foi usado para análise dos dados do teste triangular.

Análise espectrofotométrica: A análise espectrofotométrica foi realizada num espectrofotômetro (Hitachi U-2001 Spectrophotometer, Hitachi, Japão) com cubetas de quartzo com trajetória óptica de 1 cm. Como mistura solvente foram usados clorofórmio e isopropanol (v/v). O creme branco (sem os filtros analisados) foi usado para zerar o aparelho. Para verificar a estabilidade, a determinação da absorvância e a faixa de comprimento de onda de absorção dos filtros (separadamente e misturados) também foram avaliadas.

 

Resultados e Discussão

Controle microbiano: Os resultados mostraram não ter havido ocorrência de Salmonella sp, E. coli, S. aureus e P. aeruginosa nas amostras analisadas. A contagem total de microrganismos foi menor que 10 UFC/g do produto, o que está dentro dos limites permitidos pelas exigências brasileiras.11

O controle microbiológico tem o objetivo de garantir que produtos de consumo tenham boa qualidade, sejam livres de microrganismos patogênicos ou potencialmente perigosos, permitindo um limite aceitável destes microrganismos. Tem, ainda, como função, determinar o número total de microrganismos em preparações não estéreis e cosméticos, além de identificar a presença de patógenos, que no caso de cosméticos não devem estar presentes. Esse teste de contaminação microbiana também pode ser usado no controle de qualidade em farmácias magistrais, que atende às exigências da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)12 e das BPM (Boas Práticas de Manipulação).

Estabilidade físico-química: A análise espectrofotométrica foi realizada 24 horas após a preparação do creme e novamente depois que o creme foi submetido a 28 dias de estresse térmico (45°C), gerando perfis espectrofotométricos semelhantes. Essa análise sugere que tais filtros não se degradaram depois dos 28 dias de estresse térmico (Figura 1) e mostra a estabilidade dos filtros na preparação estudada, sob tais condições.

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Análise sensorial: A análise sensorial consiste de uma caracterização completa e realista das propriedades sensoriais e tácteis dos produtos cosméticos. Os voluntários precisam ser capazes de detectar e descrever todas as sensações relativas às características e propriedades do produto. Porém, devem ser tomadas algumas precauções para evitar fadiga, principalmente do olfato.

A Tabela 1 mostra a dispersão da amostra nos testes triangulares de diferença e o número de pessoas capazes de identificar a amostra diferente das outras duas.

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A Tabela 2 mostra as classificações médias dadas pelos voluntários para os cinco atributos da emulsão A/O e da emulsão O/A.

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Por meio da diferença mínima significativa (DMS) obtida pelo teste de média de Tukey (p ≤ 0,05) foi realizada uma comparação entre as médias e, novamente, não foi observada diferença significativa entre elas.

Quando comparamos o FPS para UVB usando filtros químicos idênticos em emulsões O/A e A/O, a emulsão A/O mostrou FPS mais alto. Achamos que o fato pode ser explicado pelo silicone líquido da emulsão, que permite maior valor de resistência à água, pela formação de uma película hidrófoba sobre a pele. O silicone líquido também melhora as propriedades tixotrópicas do produto.

Contudo, esse tipo de emulsão era raramente usada devido a sua baixa estabilidade e sensação pegajosa na pele. Por esse motivo, foram desenvolvidos alguns agentes com propriedades reológicas indicados às emulsões A/O. Entre eles, citamos os seguintes:

· Glicosídeo cetearílico e álcool cetearílico (Emulgade, Henkel KgaA, Düsseldorf, Alemanha), um emulsificante que dá viscosidade para preparações cosméticas, sem sensação oleosa;

· Éter dicaprilílico (Cetiol OE, Henkel), um emoliente;

· Coco caprato/caprilato (Cetiol LC, Henkel) um agente emoliente e condicionador da pele.

Esses agentes são indicados para a preparação de filtros solares em emulsões A/O por elevarem a estabilidade geral, o tempo de retenção do produto sobre a pele e a resistência ao enxágue. Estes também evitam a sensação oleosa. Assim, as emulsões A/O puderam ser resgatadas e eleitas como os melhores excipientes na preparação de cremes para proteção solar.4

A análise de aceitação (Tabela 3 e Figura 2) mostraram que 60% dos voluntários afirmaram que definitiva ou provavelmente comprariam o produto A/O, em comparação com 53% para o pro[1]duto O/A. Normalmente, os consumidores preferem emulsões O/A porque dão a sensação de pele mais seca e macia.

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Os autores buscaram desenvolver uma emulsão A/O que não causas[1]se sensação de pele oleosa, após o uso. A análise sensorial mostrou que a emulsão A/O é mais aceitável do que a emulsão O/A. Portanto, é possível desenvolver uma emulsão A/O que não dê a sensação de pele oleosa, característica das emulsões A/O.

 

Conclusão

Este estudo determinou a qualidade de um creme fotoprotetor A/O por meio da avaliação de seu controle microbiológico, estabilidade físico-química e apelo sensorial, em comparação com um creme fotoprotetor O/A. Os testes com o creme A/O mostraram que não ocorreu desenvolvimento microbiano. A análise espectrofotométrica indicou a estabilidade do creme A/O demonstrando não ter havido degradação de seus filtros solares. A análise sensorial realizada foi um teste triangular com[1]parando o creme A/O e o creme O/A em cinco características sensoriais e indicou não existir diferença significativa (p<0,05) entre ambos, sendo que 60% dos voluntários afirmaram que provável ou certamente comprariam o produto A/O. Agradecimentos: CNPq e PADC-FCF-UNESP> < 0,05) entre ambos, sendo que 60% dos voluntários afirmaram que provável ou certamente comprariam o produto A/O.

 

Agradecimentos: CNPq e PADC-FCF-UNESP

 

Este artigo foi publicado na revista Cosmetics & Toiletries (Edição em Português) 17(6): 68-70, 2005.
Publicado originalmente em inglês, Cosmetics & Toiletries 119(7): 41-46, 2004.