FPS: Conceito e Parâmetros de Influência
Potencializadores da Eficácia dos Fotoprotetores
Agentes Emulsificantes Baseados na Teoria Reticular do Gel
Agentes Reológicos
Agentes de Emoliência
Conclusão

 

À medida que as pesquisas acerca dos danos actínicos tornam-se cada vez mais conclusivas, revelando os graves riscos do fotoenvelhecimento e do câncer de pele ligados à exposição solar, maior é o empenho dos cientistas cosméticos em desenvolver produtos fotoprotetores de ação prolongada de amplo espectro, compreendendo as radiações UVB e IR solares, comprovadamente responsáveis pelos efeitos deletérios do sol na pele. 

Além disso, a utilização crescente de protetores solares apresentando FPS elevados, não apenas nas exposições prolongadas ao sol, mas também diariamente, motivada pela gravidade dos efeitos tardios e cumulativos da radiação solar na pele, tem intensificado o surgimento de filtros solares cada vez mais sofisticados. 

A título de exemplo, hoje já existem no mercado filtros extremamente potentes, como o metoxicinamato de isoamila, cuja eficiência fotoprotetora de absorção na faixa do UVB e do UVA-2, superam em 20% a do tradicional metoxicinamato de octila. Outra tendência atual também bastante expressiva, é o desenvolvimento de filtro solares altamente específicos, como o antranilato de mentila, projetado para conferir proteção exclusiva na faixa do UVA, permitindo quando associado aos absorvedores UVB, a obtenção de formulações fotoprotetoras de amplo espectro. 

No entanto, a eficácia de um protetor solar não depende apenas dos tipos e quantidades de filtros envolvidos, mas das características do produto final, sendo de importância decisiva a escolha adequada de todos os componentes da formulação, incluindo veículos, emulsionantes, coadjuvantes, entre outros. Neste sentido, a pesquisa cosmética tem oferecido várias alternativas em matérias primas que permitem o desenvolvimento de protetores solares de alta efetividade, dentre as quais destacam-se certos agentes, que embora destituídos de efeito fotoprotetor intrínseco, atuam melhorando sensivelmente a performance global de produtos contendo filtros solares. 

Neste trabalho apresentaremos alguns destes agentes que potencializam a eficiência dos fotoprotetores, suas propriedades e mecanismos, bem como os principais fatores que influenciam o desempenho dos protetores solares. 

 

FPS: Conceito e Parâmetros de Influência 

A eficácia dos produtos fotoprotetores é determinada in vivo através do fator de proteção solar (FPS) e baseia-se em métodos padronizados pelo DIN e pelo FDA. O FPS constitui-se num valor numérico que relaciona o tempo necessário para que una determinada dose de exposição ultravioleta provoque o aparecimento de um eritema perceptível na pele protegida, em comparação com o tempo requerido para o surgimento deste eritema em condições idênticas na pele desprotegida do mesmo individuo. 

Desta forma, é possível afirmar que quanto maior o valor do FPS utilizado, maior será o tempo de resistência da pele exposta à radiação UV ao surgimento do eritema solar. O valor do FPS depende naturalmente dos tipos e quantidades de filtros solares presentes na formulação, mas o aumento do FPS não ocorre de forma linear em relação ao aumento das concentrações destes filtros. Além disso, a experiência tem demonstrado que mantendo-se constante as quantidades de filtros UV em diferentes tipos de preparações, observa-se a elevação nos valores do FPS na seguinte ordem: loções hidroalcoólicas (uma fase), pomadas (uma fase), emulsões do tipo o/a (duas fases), emulsões do tipo a/o (duas fases). 

O fato das emulsões a/o que são hidrofóbicas proporcionarem os maiores valores de FPS dentre as formulações testadas demonstra que a resistência à lavagem com água é um dos fatores fundamentais de influência na eficácia dos fotoprotetores, uma vez que determina um maior tempo de retenção do produto na pele. Outro parâmetro também de grande importância na obtenção de protetores solares eficientes, é a utilização de preparações que garantam uniformidade de aplicação na pele, ou seja, que apresentem boa espalhabilidade. Por fim, deve-se ainda considerar a manutenção das propriedades tixotrópicas e a estabilidade térmica dos fotoprotetores que tendem a permanecer por longos períodos expostos ao sol, podendo haver perda da viscosidade original ou ainda comprometimento de integrantes da formulação. 

 

Potencializadores da Eficácia dos Fotoprotetores 

Existem agentes que, embora destituídos de efeito fotoprotetor intrínseco, determinam o aumento da performance das formulações contendo filtros solares. Estes agentes podem ser agrupados de acordo com o papel que desempenham na formulação nas seguintes categorias: 

Agentes filmógenos.
Perfluoropoliéreres: oblidos através da foto-oxidação do hexafluoropropeno a baixas temperaturas, estes polímeros perfluorados, devido à ausência de átomos de hidrogênio em sua estrutura e à presença de fortes ligações covalentes tais como C-O e C-F, sendo estas últimas bastante abundantes, apresentam características de extrema estabilidade físico-química incluindo a resistência à ação de solventes e às variações térmicas. 

Apresentam, ainda, baixa tensão superficial, além de total insolubilidade em água e na maioria dos solventes utilizados para fins cosméticos, o que lhes confere propriedades filmógenas ao mesmo tempo hidrofóbicas e lipofóbicas. Em função destas características, estes polímeros são capazes de dar origem a emulsões compostas de três fases (óleo/perfluoropoliéteres/água) altamente resistentes à lavagem com água, o que as torna especialmente indicadas ao uso com fotoprotetores. Desta forma é possível conferir proteção duradoura, uma vez que os perfluoropoliéteres não são retirados pela perspiração, nem por imersão em água. Alem disso, estes compostos são biologicamente inertes e não oclusivos e portanto não interferem com as funções normais da pele, são ainda estáveis frente às radiações UV e às altas temperaturas, permanecendo inalteradas nas exposições prolongadas ao sol. 

Finalmente, fotoprotetores formulados com base nos perfluoropoliéteres evitam a aplicação gordurosa desagradável na pele, que normalmente observa-se nas preparações a/o também resistentes à água. 

- Poliol-prepolimeros: compostos de oligômeros de diversos pesos moleculares, que em média podem situar-se entre 4.000 e 18.000, dependendo da composição, os polyolprepolymers, devido à sua natureza fortemente lipofílica, formam, quando aplicados na pele, um gradiente de concentração ao longo do estrato córneo, dando origem a um reservatório de longa duração nas camadas superficiais da pele, jamais ultrapassando-as em função do tamanho elevado de suas moléculas. 

Quando incorporado às formulações cosméticas, especialmente as emulsões, os poliolprepolímeros permitem a formação de um filme hifrofóbico na pele, que atua regulando a deposição/liberação de vários ingredientes. 

O uso destes compostos em protetores solares determina uma maior resistência à lavagem com água, permitindo considerável aumento do tempo de permanência na pele. Além disso, os poliolprepolímeros facilitam a espalhabilidade das formulações fotoprotetoras, evitando irregularidades de aplicação que determinariam falta de uniformidade da proteção ao sol na pele. 

Segundo testes de substantividade efetuados com uma formulação fotoprotetora contendo benzofenona-3, metoxicinamato de octila, salicilato de octila e ácido fenil-benzimidazol-sulfônico, na presença de 3% de polyolprepolymer-2, utilizando-se métodos padronizados de imersão em água, observou-se um aumento da deposição do produto na pele, resultando em efeito fotoprotetor prolongado, com duração de 8 horas (FPS=30). 

- Silicones: as propriedades lubrificantes, protetoras, filmógenas e hidrofóbicas da maioria destes compostos de silício já são bem conhecidas, o que tem permitido sua utilização em praticamente todas as preparações cosméticas. No que se refere aos fotoprotetores, a inclusão de silicones confere à formulação maior insolubilidade em água, aumentando o tempo de permanência do produto na pele. 

Das várias categorias de silicones, os tradicionais dimeticones e ciclometicones têm sido largamente empregados em protetores solares, principalmente quando combinados a resinas, como o trimetilsiloxisilicato, que lhes conferem características ainda superiores de resistência à lavagem com água. 

Recentemente foram desenvolvidos copolímeros que combinam resinas de silicones com ésteres orgânicos do ácido láurico e do ácido isoestearílico, os quais potencializam o efeito de fotoprotetores pela capacidade que apresentam de formar filmes resistentes à água, além de apresentarem extrema afinidade pela pele e baixíssima toxicidade.

 

Agentes Emulsificantes baseados na Teoria Reticular do Gel 

Como sabemos, segundo o conceito tradicional, emulsões podem ser definidas como sistema disperso consistindo de dois líquidos imiscíveis estabilizados através de emulsificantes, dando origem a uma fase continua que engloba as gotículas da fase dispersa. 

Recentemente, no entanto, foi sugerida uma nova teoria relativa às emulsões o/a que propõe a obtenção de sistemas trifásicos baseados na teoria reticular do gel. Estes sistemas consistem numa fase externa aquosa, uma fase dispersa de cristal líquido contendo uma fase oleosa, e a estrutura reticular do gel. Atualmente é possível preparar emulsões desta natureza utilizando-se um complexo emulsificante composto de ésteres poliglicerínicos de ácidos graxos, alcoóis graxos e lactilato estearílico de sódio. Desta forma, obtêm-se emulsões de três fases muito estáveis nas quais a estrutura de rede funciona como uma "grade entrelaçada" que impede que as gotículas dispersas coalesçam provocando a separação de fases. 

Além disso, estes sistemas permitem o preparo de fotoprotetores extremamente eficientes, devido às seguintes propriedades: 

- Permanecem estáveis em temperaturas elevadas (até 50°C). suportando inalterados exposições intensas e/ou prolongadas ao sol; 

- Conferem elevada resistência à água pela formação de um filme hidrofóbico na pele, dando origem a produtos water proof; 

- Conferem aumento dos valores de FPS até níveis elevados devido à adequação que proporcionam as propriedades tixotrópicas das formulações contendo absorvedores UV. 

Desta forma é possível obter protetores solares de longa duração, seguros e com elevada performance fotoprotetora. 

 

Agentes Reológicos 

A experiência mostra que, mantendo-se constante os filtros solares utilizados em diferentes veículos, as emulsões do tipo a/o permitem, quando comparadas a outras preparações cosindicas, a obtenção dos FPS mais elevados. No entanto, este tipo de emulsão tem sido pouco utilizada devido à sua baixa estabilidade e pelo desconforto com características "pegajosas" que provoca quando aplicada na pele. 

Visando contornar estes inconvenientes, foram desenvolvidos agentes com propriedades reológicas indicados especificamente às emulsões a/o preparados a partir do magaldrato, caracterizado por uma estrutura reticular de multicamadas de formas octaédricas empilhadas e carregadas positivamente e camadas intermediárias carregadas negativamente, formadas por ânions cercados por complexos de água de cristalização, dando origem ao hidroxiestearato de alumínio e magnésio que apresenta características hidrofóbicas, com capacidade de formar gel com a maioria dos óleos utilizados na área cosmética (óleo mineral, de jojoba, de silicone, triglicérides cáprico/caprílico etc). 

Estes agentes estão especialmente indicados ao preparo de fotoprotetores em emulsões do tipo a/o e água-silicone, uma vez que aumentam a estabilidade geral, principalmente no que se refere à resistência às altas temperaturas, sem que haja comprometimento da viscosidade original da formulação, além de conferirem leve comportamento tixotrópico. Além disso, promovem aumento do tempo de retenção do produto na pele, evitando a retirada pela lavagem com água. E finalmente, evitam o toque gorduroso normalmente observado neste tipo de preparação. 

Sendo assim, é possível, através destes agentes, resgatar as emulsões com fase externa oleosa, elegendo-as como veículos preferenciais ao preparo de protetores solares. 

 

Agentes de Emoliência 

Existem alguns emolientes que aumentam consideravelmente o FPS dos fotoprotetores. Isto talvez ocorra pelo aumento da lipofilicidade que estes agentes proporcionam, determinando uma melhor deposição dos protetores solares na pele e uma maior resistência à água. Um exemplo expressivo é o neopentanoato de octildodecila, um emoliente não comedogênico e estável que tem a propriedade de elevar o FPS quando incorporado em fotoprotetores, segundo demonstram vários testes, com diferentes associações de filtros solares nos quais a presença deste agente determina a obtenção de FPS muito acima do esperado. 

Esta propriedade pode também ser observada com o óleo de abacate, sendo que há indícios da presença de substâncias fotoprotetoras naturais em sua composição, e finalmente o mesmo ocorre com o acetato de tocoferila (vitamina E), por mecanismos ainda não elucidados. 

 

Conclusão 

A eficiência de um fotoprotetor não depende apenas da escolha dos filtros solares a serem empregados, mas pode ser sensivelmente melhorada pela atuação de agentes que potencializam a performance global da preparação, atuando como formadores de filme hidrofóbico resistente à água, conferindo estabilidade térmica, permitindo o ajuste das propriedades reológicas e tixotrópicas, dentre outros mecanismos.

 

Este artigo foi publicado na revista Cosmetics & Toiletries (Edição em Português),7(4): 34-37, 1995.