Cosméticos veganos

Vegano, natural ou orgânico?

Oportunidades e desafios

Potencial para crescer 

 

Cosméticos veganos

     A busca por um estilo de vida mais saudável e sustentável vem influenciando o comportamento e as escolhas de consumo dos brasileiros. A adesão a produtos veganos – que ainda engatinha no país, mas tem potencial para crescer nos próximos anos – faz parte desse cenário.

     O termo “veganismo” foi criado pela The Vegan Society, em 1944, no Reino Unido. A entidade foi criada por ex-membros da The Vegetarian Society, que haviam se desligado do grupo por diferenças ideológicas.

     Na definição da The Vegan Society, veganismo é uma forma de viver “que busca excluir, na medida do possível e do praticável, todas as formas de exploração e de crueldade contra animais, seja para a alimentação, para o vestuário ou para qualquer outra finalidade”. O veganismo recusa a ingestão de produtos como carnes, leite, ovos e mel e o uso de qualquer produto que seja desenvolvido a partir da exploração de animais, como roupas e artigos de couro, pele, lã e seda; adornos feitos de marfim, plumas, penas ou ossos e quaisquer produtos que tenham sido testados em animais ou cujos ingredientes tenham origem animal.

     O veganismo é, portanto, um conceito mais amplo do que o vegetarianismo, que exclui da alimentação o consumo de todos os tipos de carne e seus derivados. Existem, no entanto, muitos alimentos que já sã naturalmente veganos, como arroz, feijão, frutas, legumes, castanhas e vários outros.

 

Vegano, natural ou orgânico?

     É natural que exista alguma confusão entre as definições de cosméticos naturais, orgânicos e veganos, em razão da aparente similaridade entre eles. Não há uma legislação específica referente a esses segmentos no país. De acordo com as principais certificadoras de produtos orgânicos e naturais, para que um cosmético seja considerado natural, ele deve conter, no mínimo, 95% de ingredientes naturais e 5% de ingredientes orgânicos. Já o cosmético orgânico é aquele que possui no mínimo 95% de matérias-primas orgânicas em relação à quantidade total de ingredientes naturais utilizados na formulação.

     Para que seja considerado vegano, o cosmético não pode conter ingredientes de origem animal – como mel, leite ou lanolina, comumente encontrados em produtos naturais – nem ter sido testado em animais. Veganos não consomem sabonetes feitos de glicerina animal ou maquiagens com cera de abelha, por exemplo. Em outros mercados do mundo, como Europa e Estados Unidos, produtos veganos podem ser identificados pelo consumidor por meio de selos como o “Cruelty Free”, da PETA (People for the Ethical Treatment of Animals) e o “Certifi ed vegan”, da Vegan Action.

     No Brasil, a preocupação da sociedade em relação a questões como os testes realizados em animais criou um ambiente favorável ao avanço de produtos “vegan-friendly”. Não há, contudo, dados de consumo específicos sobre produtos veganos no país, embora existam informações que indicam uma tendência de crescimento. (veja mais na pág. 17).

 

Oportunidades e desafios

leticia.png     Apesar de não se posicionar como uma marca vegana, a Weleda informa que a maioria de seus produtos são apropriados para veganos. “Nosso mais recente lançamento, a linha corporal de Prímula, indicada para peles maduras, é um exemplo, pois não contém nenhum ingrediente ou derivado de origem animal. A Weleda possui a certificação internacional do selo Natrue, pela rigorosidade no processo produtivo e pelos ingredientes naturais e orgânicos que utiliza [...]. Cada ingrediente é cuidadosamente estudado por anos por nossa equipe de P&D, para chegar numa composição eficaz, harmoniosa e holística”, afirma Letícia Hara, diretora comercial da Weleda do Brasil.

 imagem_126.png    A Weleda oferece vários produtos que podem ser usados por veganos, em itens para cuidado facial, corporal, para mamães e bebês, de cuidado oral e capilar. O site da marca identifica os cosméticos veganos com um selo. Este, por sua vez, traz a informação de que o produto não contém matérias-primas derivadas de animais, mas que o contato deste e de suas matérias-primas com material de origem animal, durante o processo de fabricação, “não pode ser descartado totalmente”.

     Letícia destaca que o consumidor não procura apenas um produto que atenda às suas necessidades. “Ele também quer uma marca que tenha uma posição mais consciente e responsável em relação ao ecossistema. Essas pessoas que querem ter uma vida mais natural são também as que fazem suas escolhas com base nas atitudes das marcas. Não basta fazer bem para a pessoa, é preciso fazer bem para o planeta. Portanto, a procura por produtos naturais, orgânicos e veganos, vem seguida de uma preocupação que vai além do indivíduo”, salienta.

     Recentemente, a Weleda mudou toda a identidade visual de suas farmácias, para atrair novos consumidores e deixar em evidência o portfólio de cosméticos. A empresa também investiu em novas parcerias, experimentação de produtos e outras ações que devem aumentar a visibilidade da marca. “Além disso, estamos ampliando nossa distribuição em grandes redes de drogarias, o que é uma vitória, pois estamos conseguindo ganhar espaço em um varejo dominado por marcas de cosméticos convencionais”, comenta.

célia.png     Todos os produtos da Surya Brasil são 100% veganos. São mais de 140 itens divididos entre shampoos, condicionadores, máscaras capilares, cremes hidratantes, esfoliantes, óleos de massagem e uma linha masculina. “Na escolha dos nossos ingredientes, sempre buscamos matérias-primas de origem vegetal, não testadas em animais, livres de glúten, orgânicas e de alta qualidade. Por meio de fornecedores qualificados e certificados (pela Ecocert e USDA), conseguimos obter uma matéria-prima eficaz e ‘correta’ como um todo”, diz Clélia Angelon, fundadora da empresa.

     A Surya Brasil lançou recentemente a Exotic Animals, linha de esmaltes composta por 16 cores, além de extra brilho, óleo secante, base e removedor de esmaltes orgânico. “Os produtos da Exotic Animals não contêm componentes químicos agressivos, como cânfora, DBP, formaldeído, parabenos e tolueno, e são livres de ingredientes de origem animal e de testes em animais. O removedor é composto por solventes amigos da natureza e glicerina vegetal, além de óleos orgânicos de argan, buriti e patauá, que nutrem intensamente as unhas, evitando que fiquem secas e esbranquiçadas”, destaca.

imagem_220.png     Para Clélia, além da compaixão em relação aos animais, há uma crescente procura por cosméticos que não agridam a saúde do corpo e do planeta. “Desenvolver produtos naturais, orgânicos e veganos certificados no Brasil ainda é um duro desafio, mas a força do público consumidor já está mudando este paradigma”, aponta.

     Os produtos da marca estão presentes em mais de 40 países, como Uruguai, Argentina, Chile, Peru, Equador, Alemanha, Holanda, Irlanda, Reino Unido, França, Polônia, Austrália, Japão, Índia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. “Também temos uma forte distribuição nos Estados Unidos”, acrescenta. A empresa estima um crescimento de 50% para 2015. “Essa meta deve ser batida, principalmente pela conquista de mercados no exterior”, completa.

     Com mix de produtos totalmente vegano, a Feito Brasil atua no setor desde 2004 e oferece produtos capilares, para tratamento facial e corporal, de higiene pessoal e alguns itens para casa. São hidratantes, esfoliantes, cremes para mãos e pés, sabonetes em barra, sabonetes líquidos, velas para massagem, máscara de argila, óleos, produtos masculinos, sais de banho, perfumes de ambiente e de carro, e kits para banho.

imagem_317.png     Dentre os itens de maior destaque estão os sabonetes da coleção Dom Tropical, que, além do inusitado formato de picolé, apresentam níveis diferentes de esfoliação – nas versões Amora, Carambola, Coco, Manga, Jabuticaba e Pitanga. A formulação dos sabonetes traz ingredientes como óleo de oliva e um tensoativo natural obtido do amido de milho.

     Um dos últimos lançamentos da empresa é a coleção Destinos do Brasil, que explora o conceito de “SPA em casa”. A linha é composta por: Gomagem Corporal, Gel de Banho Gelado, Hidratante de Banho, Loção Iluminadora com Efeito Bronzeador e Óleo para Massagem. A linha facial Segredos de Camarim é uma das mais vendidas. Ela traz espuma de limpeza, gel esfoliante, loção tônica e demaquilante, máscara de argila e fluido hidratante.

  giulio.png   “Esse é um mercado que ganhou bastante visibilidade e é visto como uma grande oportunidade para diversas empresas”, afirma o diretor de marca, Giulio Peron. “A questão dos testes explodiu na mídia, principalmente após o caso dos beagles no Instituto Royal, em 2013. De lá para cá, muitos consumidores que não tinham consciência a respeito desse tipo de teste passaram a se informar sobre produtos livres de ingredientes animais, em todos os setores. Acredito também nessa conscientização por conta do acesso à informação, facilitado por sites, redes sociais, imprensa e grupos ativistas”, diz.

     Peron ressalta que os preceitos veganos nortearam as atividades da Feito Brasil desde sua criação e que a procura pelos produtos vem aumentando “consideravelmente”. “É muito legal recebermos e-mails de clientes e mensagens através das mídias sociais com conteúdo de apoio ao nosso modelo de negócio, que é artesanal, vegano e sustentável”, salienta.

     Ele acredita que os maiores desafios para o segmento estão relacionados aos selos e certificações, “que são extremamente caros, e os mais relevantes são de origem internacional, o que dificulta um pouco. Outro ponto a ser levantado são os casos específicos de formulações que exigem maior investimento em pesquisa, para ingredientes substitutos aos de origem animal”. Atualmente os produtos da Feito Brasil são comercializados apenas em território nacional. A empresa, que tem expectativa de 18% de crescimento para este ano, está buscando parceiros investidores para a etapa de exportações.

imagem_412.png     Em 1998, a Granado deu início à produção de sabonetes de glicerina com base 100% vegetal. “Os sabonetes são amplamente indicados por dermatologistas, devido ao método de fabricação único, que garante uma concentração superior de glicerina vegetal no produto final [...]. O produto ainda é composto por açúcar, ingrediente natural reconhecido por sua propriedade hidratante. Hoje são fabricados mensalmente 8,5 milhões de unidades de sabonetes Granado e Phebo”, informa Luiza Ferrez, relações públicas da Granado.

     Ela menciona produtos como o Esfoliante Limão Siciliano Phebo – com formulação à base de grânulos de arroz e enriquecido com manteiga de murumuru –, e a Manteiga Corporal Limão Siciliano Phebo, produto com base vegetal e enriquecido com ceras de murumuru, cupuaçu e karitê.

     “Percebemos que os consumidores têm procurado marcas com as quais eles se identificam. Eles estão mais conscientes e preocupados com o meio ambiente, querem saber sobre a formulação e os ingredientes. A Granado está alinhada com esse consumidor, que opta por comprar um produto um pouco mais caro, mas que não possui gordura animal, é rico em extratos vegetais e não é testado em animais”, argumenta.

     A Elemento Mineral está no mercado desde junho de 2012, oferecendo cosméticos faciais, corporais, produtos para higiene pessoal e fragrâncias para ambiente.

jurema.png     “Temos como princípio nunca utilizar matéria-prima de origem animal e nem testada em animais. Isso já faz parte do DNA da empresa”, comenta Jurema Jacobini, sócia-proprietária. São produtos de destaque o Sabonete Gommage com Cristais de Quartzo, o Nude Balm Hidratante Facial, a Máscara Bio Mineral, as Bio Argilas, as Argilas com Pedras Preciosas e os Sabonetes Vegetais com Argilas.

 imagem_57.png    “O veganismo está ganhando espaço aos poucos, e isso caminha junto com a busca por uma vida mais saudável, a escolha por alimentos sem agrotóxicos, o lixo seletivo e a reciclagem de materiais. Todos esses hábitos são muito novos no Brasil, e o veganismo é ainda um nicho de mercado”, comenta. Jurema aponta a ausência de uma regulamentação oficial no país, que defina se o produto é vegano. “Temos os selos orgânicos, mas isso confunde os consumidores. Muitos produtos certificados como naturais e orgânicos podem possuir ingredientes de origem animal e realizar testes em animais. Apenas fora do Brasil existem esses certificados, como o Vegan Action, o Leapping Bunny e o Cruelty Free”, diz. A Elemento Mineral exporta para Hong Kong, Inglaterra, Estados Unidos e Austrália.

 

Potencial para crescer 

Para o biólogo Guilherme Carvalho, secretário-executivo da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), a oferta de produtos veganos está crescendo, mas em ritmo inferior à demanda. “Há muita demanda reprimida. As empresas que oferecem opções veganas estão encontrando um mercado pujante e carente de produtos”, acredita.

     “Algumas das maiores celebridades do mundo estão adotando um estilo de vida vegano. A exploração de animais para consumo e para experimentação está encontrando cada vez mais objeções. As pessoas estão começando a perceber que essa é a maior mudança que elas podem fazer para contribuir para um mundo melhor - para os animais, para o meio ambiente e para elas”, enfatiza.

     Aproximadamente 8% da população brasileira se declara vegetariana, de acordo com uma pesquisa do Ibope, realizada em 2012. O percentual, ainda que não se refira aos veganos, é um indicativo das mudanças comportamentais dos brasileiros nos últimos anos. “Esse número só tende a crescer, sobretudo com a rápida difusão de informações que a internet proporciona. Os velhos hábitos estão ficando para trás. O potencial é imenso, e as empresas que saírem na frente ganharão vantagem”, conclui.

     Uma análise feita pelo portal vegano vista-se, com a ajuda do Google Trends, constatou que o interesse da população brasileira pelo veganismo aumentou mais de 500% nos últimos cinco anos. A ferramenta gratuita do site de buscas gera gráficos e números que demonstram a popularidade de um termo de pesquisa, em uma escala que varia de 0 a 100, em um período predeterminado.

     A pesquisa utilizou como parâmetro o termo “vegano” e analisou sua escalada de popularidade nos anos 2010 a 2015. No primeiro mês analisado, janeiro de 2010, o termo tinha apenas 18 pontos na escala. Em janeiro de 2013, a palavra já havia chegado a 37 pontos. Em janeiro de 2015, o termo “vegano” atingiu o ponto máximo da escala, com 100 pontos.

     A título de comparação, o termo “vegetariano” teve um aumento de 42% em sua popularidade nos mesmos cinco anos.

     Os estados que mais aumentaram seu interesse pelo veganismo no período analisado foram: Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Paraná. Entre as pesquisas que incluem a palavra “vegano”, “bolo vegano” é o termo que as pessoas mais buscam no Google. Na sequência aparecem “o que é vegano” e “vegano vegetariano”.

 

Esta matéria foi publicada na edição nov/dez_2015 da revista Cosmetics & Toiletries Brasil