A volta dos cachos
Enfrentando a transição capilar |  Muito além do espelho |  No Poo e Low Poo

 
A volta dos cachos

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  Depois do boom dos alisamentos – alavancado pela chegada da escova progressiva, no final da década de 1990 –, cresce o número de pessoas que escolheram fazer o caminho de volta, optando por cabelos naturais e volumosos. O retorno aos cachos faz parte de um movimento de valorização da autenticidade e da diversidade, bem como de formas mais naturais de cuidar dos fios. As demandas desses consumidores impulsionam lançamentos na indústria, a criação de salões especializados no segmento e de cursos de especialização voltados ao cuidado de cabeleiras crespas e cacheadas.
  Os fios encaracolados e crespos passaram por várias estéticas na história recente. Disciplinados pelos primeiros alisamentos no início do século passado, eles foram presos em coques e outros penteados nos anos 1950 e 1960, até chegar ao movimento black power, na década de 1970. Naquele período, vários artistas negros se destacaram no panorama musical e cinematográfico. No Brasil, Elis Regina imortalizava “Black is beautiful”, canção de Marcos Valle, em 1971.

   Nos anos 1980, a permanente – técnica que encaracolava fios lisos – virou febre. O objetivo era conferir volume aos cabelos, que também eram enrolados com a ajuda de bobes e “bigudinhos”. A predileção por fios lisos e chapados voltou a ganhar força na virada do século, quando a escova progressiva método que revolucionou o mercado de transformação capilar no país – conquistou uma legião de usuárias.
 
   A primeira década do século 21 trouxe, portanto, novas tecnologias para alterar a forma e diminuir o volume dos fios. Em contrapartida, o período também evidenciou a tendência de “desconstrução” de padrões estéticos.
   Historicamente, sabemos que os cabelos são carregados de simbolismos. Nesse sentido, a adesão aos fios crespos e
cacheados agrega o desejo de afi rmação, liberdade de escolha e quebra de paradigmas de beleza. Esse cenário integra um
questionamento maior da sociedade, em relação ao que é belo.  No que diz respeito aos cabelos, há espaço para uma profusão de estilos, em fios lisos, multicoloridos, trançados, crespos, cacheados, volumosos e cheios de personalidade.
  No entanto, a recuperação da forma original dos cabelos e a manutenção da beleza dos fios encaracolados exigem um cuidado especial. Nos últimos anos, fabricantes de cosméticos têm investido, de forma expressiva, em lançamentos para suprir a carência de produtos específicos para esses cabelos. As consumidoras passaram a contar com novos itens e formulações mais elaboradas. Além de investir no desenvolvimento de produtos voltados para esses tipos de fios, grandes marcascomeçaram a dar mais visibilidade a mulheres de cabelos cacheados em suas campanhas e ações.
 
   O surgimento de salões voltados exclusivamente ao cuidado dos cabelos crespos e cacheados também faz parte desse panorama, bem como a criação de cursos de especialização para cabeleireiros. Em outubro do ano passado, o Instituto Embelleze lançou o Curso Profissional de Cachos. “Os fios cacheados merecem atenção e técnica apurada, pois exigem tratamentos, cortes e colorações específicas. Os processos são bem diferentes de outras tipologias, e por isso é tão importante que cabeleireiros interessados em trabalhar com cabelos cacheados se especializem”, destacou o gerente de marketing do Instituto Embelleze, Eduardo Tegeler, à época do lançamento do curso.
 
   Com carga horária de 44 horas e duração de dois meses e meio, o curso é direcionado aos profissionais da área que já têm conhecimentos básicos. Nessa especialização, o aluno adquire conhecimentos sobre a fisiologia dos cachos, os tipos de tratamentos específicos para cada grau de curvatura, como lidar com clientes em transição capilar, como fazer coloração e mechas e quais são os cortes mais indicados para cada tipo de fio, além das técnicas “no poo” e “low poo”.

 
 
Enfrentando a transição capilar
 
 O momento é de valorização dos cabelos volumosos, que estão em evidência em campanhas publicitárias, no visual de ícones de beleza e no espelho da adolescente que nem pensa em abrir mão de seus caracóis. Contudo, para quem passou anos submetendo os cabelos a procedimentos de alisamento, o resgate dos fios naturais requer tempo e paciência.
 
   A transição capilar é o período em que a pessoa para de realizar alisamentos e deixa os fios naturais crescerem, cortando gradualmente o comprimento, para ir eliminando os fios com química. Nesse período, não é recomendável o uso de secadores, chapinhas ou modeladores de cachos para dar forma aos fios. Essa conduta, apontam os especialistas no assunto, continuaria a fragilizá-los e retardaria a “redescoberta” do volume e da textura originais dos cabelos.
   Durante a transição, os cortes continuam a ser feitos, até que os cabelos atinjam um comprimento ideal para o big chop (o grande corte), que tira todas as pontas lisas. Abrir mão de fios longos e aderir a um visual completamente diferente é uma decisão difícil, mas que encerra uma fase complicada, na qual é preciso lidar com o volume na raiz dos cabelos, que se contrapõe às pontas ainda lisas e quebradiças.